quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

A Realidade da Vida



   "A Primeira Nobre Verdade é conhecida como verdade de dukka. Originalmente, os verdadeiros significados de dukka são: “difícil de aguentar”, “insatisfatório”, “imperfeito”, “frustrante” e “vazio”. A palavra dukka, entretanto, é frequentemente traduzida como sofrimento. Este conceito, chamado as “más novas” do budismo, fez com que algumas pessoas erroneamente interpretassem o budismo como pessimista e contra a vida. Mas a mensagem básica do Budha, ou a “boa nova” do Dharma, é justamente que existe uma maneira de se libertar do sofrimento. A mensagem do Dharma é inerentemente otimista; ela contém a promessa, a possibilidade real, de um renascimento espiritual e do final do sofrimento – a iluminação espiritual que transcende à morte, conhecida como Nirvana.

   O Dharma de Budha não ensina que tudo é sofrimento. O que o budismo diz é que a vida, por natureza, é difícil, cheia de problemas e imperfeita. Para a maioria de nós, este fato da vida dificilmente é uma novidade. Quem entre nós tem uma vida perfeita? É claro que todos nós gostaríamos de viver uma vida maravilhosa o tempo todo. Mas não vai acontecer. Esta é a natureza da vida, e esta é a Primeira Nobre Verdade. Do ponto de vista budista, não se está fazendo um julgamento sobre as tristezas ou alegrias da vida, mas apenas uma simples descrição, usando o senso comum. A verdade é que todos nós vamos experimentar altos e baixos na vida, não importa quem sejamos. É parte do passeio na montanha-russa. O budismo não é pessimista nem pessimista: é realista.

   Por um momento, vamos parar e pensar na Primeira Nobre Verdade, a verdade de dukka, do ponto de vista de Budha. Enquanto ele era uma criança e um jovem adulto, esteve protegido dos fatos vida – da doença, da morte, da infelicidade e da pobreza. No palácio de seu pai, totalmente abrigado contra a realidade, aprendeu que sua riqueza, sua beleza, sua força física e seu poder o protegeriam de qualquer dificuldade.

   Entretanto, interiormente, o Budha sempre deve ter sabido que o mundo estava cheio de sofrimento, por mais que seu pai tentasse protegê-lo da realidade. É interessante notar que a mãe de Budha morreu poucas semanas após o parto, e ele deve ter se perguntado sobre o que acontecera com ela, mas estas perguntas nunca foram respondidas. Os psicólogos modernos diriam que o Budha foi criado para negar a realidade. Nós todos sabemos que a negação é o sistema de defesa que usamos como proteção quando a verdade nos parece difícil demais de suportar. Quando amadureceu, o Budha não queria este tipo de proteção contra a realidade. Ele percebeu que apesar de todas as suas posses e todo o seu poder, em última instância não poderia evitar os problemas da vida. Ninguém pode.

   Como a maioria de nós o grande desafio do Budha foi o seu apego aos valores materiais. Colocar esses valores em perspectiva foi uma parte essencial de seu caminho para a liberdade, reconhecendo os apegos residuais aos prazeres mundanos que porventura ainda existissem. Ele precisava o obscurantismo da ilusão – ou seja, a sua própria negação- e ver a realidade da existência condicionada, conhecida como Samsara, com todos os defeitos a ela inerentes. Para todos nós, esta é uma parte essencial do caminho da iluminação: Desperte seu inato Budha interior; rompa com os sistemas de negação que existem em sua vida; veja através dos véus da ilusão, reconheça quem e o que você realmente é, e descubra a verdade das coisas como realmente são."

Do livro “O despertar do Buda Interior” Lama Surya Das, pag. 91 e 92. Editora Rocco.