“Toda manhã, pense quando você acordar:
Eu estou vivo,
Eu tenho uma preciosa existência humana,
Eu não vou desperdiçá-la.
Eu vou usar todas as minhas energias para me desenvolver,
Para expandir o meu coração para os outros,
Para alcançar a iluminação para o benefício de todos os
seres.
Eu não vou ficar com raiva, Ou pensar mal de outros.
Vou beneficiar os outros, tanto quanto eu posso.”
Dalai
Lama.
"Se estamos conscientes disso ou não, todas as nossas ações
começam com uma motivação. Seja indo para a geladeira para pegar um lanche ou
tomar a decisão de vender tudo e construir um centro de retiro de yoga na
Islândia, sempre temos algum tipo de objetivo em mente. Na maioria das vezes os
nossos objetivos são bastante auto-centrados. Queremos felicidade para nós
mesmos. Queremos conforto e segurança. Embora não haja nada de errado com a
procura de nossa própria felicidade, também é bom expandir nossas motivações
para incluir outros. Tente recitar esta aspiração simples todas as manhãs por
um mês e ver como ele muda sua atitude, sua visão de mundo e seu senso geral de
bem-estar."
A
DISCIPLINA MENTAL,
Trecho do livro ”A arte da Felicidade”
Enquanto ele falava, descobri algo muito interessante na
abordagem do Dalai-Lama para alcançar a felicidade. Ela era absolutamente
prática e racional: identificar e cultivar estados mentais positivos;
identificar e eliminar estados mentais negativos. Embora sua sugestão de
começar pela análise sistemática da variedade dos estados mentais que experimentamos
me parecesse de início um pouco árida, aos poucos fui me encantando com a força
da sua lógica e raciocínio. E gostei do fato de que, em vez de classificar os
estados mentais, as emoções ou desejos com base em algum julgamento moral
imposto de fora, como “a cobiça é um pecado” ou “o ódio é condenável”, ele
distingue as emoções como positivas ou negativas atendo-se apenas ao fato de
elas acabarem levando ou não à felicidade.
— Se a felicidade é uma simples questão de cultivar mais
estados mentais positivos, como a generosidade entre outros, por que tanta
gente é infeliz? — perguntei-lhe ao retomar nossa conversa na tarde do dia
seguinte.
— Alcançar a verdadeira felicidade pode exigir que efetuemos
uma transformação na nossa perspectiva, nosso modo de pensar, e isso não é nada
simples — respondeu ele. — É necessária a aplicação de muitos fatores
diferentes provenientes de direções diferentes. Não se deveria ter a ideia, por
exemplo, de que há apenas uma solução, um segredo; e de que, se a pessoa
conseguir acertar qual é, tudo dará certo. É semelhante a cuidar direito do
corpo físico. Precisa-se de uma variedade de vitaminas e nutrientes, não apenas
de um ou dois. Da mesma forma, para alcançar a felicidade, precisa-se de uma
variedade de abordagens e métodos para lidar com os vários e complexos estados
mentais negativos, e para superá-los. E se a pessoa está procurando superar
certos modos negativos de pensar, não é possível conseguir isso apenas com a
adoção de um pensamento específico ou a prática de uma técnica uma vez ou duas.
A mudança demora. Mesmo a mudança física leva tempo. Por exemplo, se a pessoa
está mudando de um clima para outro, o corpo precisa de tempo para se adaptar
ao novo ambiente. E, da mesma forma, transformar a mente leva tempo. São muitos
os traços mentais negativos, e é necessário lidar com cada um deles e
neutralizá-los. Isso não é fácil. Exige a repetida aplicação de várias técnicas
e a dedicação de tempo para a familiarização com as práticas. É um processo de
aprendizado.
“Creio, porém, que à medida que o tempo vai passando,
podemos realizar mudanças positivas. Todos os dias, ao acordar, podemos
desenvolver uma motivação positiva sincera, pensando, ‘Vou utilizar este dia de
um modo mais positivo. Eu não deveria desperdiçar justamente este dia.” E
depois, à noite, antes de nos deitarmos, poderíamos verificar o que fizemos,
com a pergunta ‘Será que utilizei este dia como planejava?’ Se tudo correu de
acordo com o planejado, isso é motivo para júbilo. Se não deu certo, deveríamos
lamentar o que fizemos e passar a uma crítica do dia. Assim, através de métodos
como esses, é possível aos poucos fortalecer os aspectos positivos da mente.
“Agora, no meu caso como monge budista, por exemplo,
acredito no budismo e através da minha própria experiência sei que essas
práticas budistas me são muito úteis. Contudo, em decorrência do hábito, ao
longo de muitas vidas, certos aspectos podem brotar, como a raiva ou o apego. E
nesse caso o que eu faço é o seguinte: em primeiro lugar, o aprendizado do
valor positivo das práticas; em segundo, o fortalecimento da determinação; e,
finalmente, a tentativa de implementar as práticas. No início, a implementação
das práticas positivas é muito fraca. Com isso, as influências negativas ainda
detêm grande poder. Porém, com o tempo, à medida que vamos gradativamente
implantando as práticas positivas, os comportamentos negativos se reduzem
automaticamente. Portanto, a prática do Dharma é de fato uma constante batalha
interior, que substitui o antigo condicionamento ou hábito negativo por um novo
condicionamento positivo.”
E prosseguiu.
— Não importa qual seja a atividade ou a prática, a que
queiramos nos dedicar, não há nada que não se tome mais fácil com o treinamento
e a familiaridade constantes. Por meio do treinamento, podemos mudar, podemos
nos; transformar. Dentro da prática budista, há vários métodos voltados para o
esforço de manter a mente calma quando acontece algo de perturbador. Através da
prática repetida desses métodos, podemos chegar ao ponto em que alguma
perturbação possa ocorrer, mas os efeitos negativos exercidos sobre nossa mente
permanecem na superfície, como ondas que podem agitar a superfície do oceano
mas que ,tão têm grande impacto nas profundezas. E, embora minha experiência
possa ser muito limitada, descobri a confirmação disso na minha própria
prática. Portanto, se recebo alguma notícia trágica, naquele momento posso
experimentar alguma perturbação na minha mente, mas ela desaparece muito
depressa. Ou ainda, posso me irritar e gerar alguma raiva; mas, da mesma forma,
ela se dissipa com rapidez. Não há nenhum efeito nas profundezas da mente.
Nenhum ódio. Esse ponto foi alcançado através do exercício gradual. Não
aconteceu da noite para o dia.
Claro que não. O Dalai-Lama vem se dedicando ao treinamento
da mente desde os quatro anos de idade.
O treinamento sistemático da mente — o cultivo da
felicidade, a genuína transformação interior através da seleção deliberada de
estados mentais positivos, seguida da concentração neles, além do
questionamento dos estados mentais negativos — é possível graças à própria
estrutura e função do cérebro. Nascem os com cérebros que já vêm equipados geneticamente
com certos padrões de comportamentos instintivos. somes predispostos mental,
emocional e fisicamente para reagir ao ambiente com atitudes que permitam nossa
sobrevivência. Esses sistemas básicos de instruções estão codificados em
inúmeros modelos inatos de ativação de células nervosas, combinações
específicas de células do cérebro que atuam em resposta a algum dado
acontecimento, experiência ou pensamento. No entanto, a configuração dos nossos
cérebros não é estática, não é irrevogavelmente fixa. Nossos cérebros também
são adaptáveis. Neurocientistas documentaram o fato de que o cérebro pode
projetar novos modelos, novas combinações de células nervosas e de
neurotransmissores (substâncias químicas que transmitem mensagens entre as
células nervosas) em resposta a novos estímulos. Na realidade, nosso cérebro é
maleável e sempre está mudando, reconfigurando seus circuitos de acordo com
novos pensamentos e experiências. E, em decorrência do aprendizado, a função
dos próprios neurônios individuais muda, o que permite que os sinais elétricos
transitem por eles com maior rapidez. Os cientistas chamam de “plasticidade” a
capacidade de mudar inerente ao cérebro.
Essa capacidade de redefinir a configuração do cérebro, de
desenvolver novas conexões neurais, foi demonstrada em experiências como, por
exemplo, uma realizada pelos Drs. Avi Karni e Leslie Underleider do National
Institutes of Mental Health. Nessa experiência, os pesquisadores fizeram com
que os objetos desempenhassem uma tarefa simples de coordenação motora, um
exercício de batucar com os dedos, e identificaram por meio de um exame de
ressonância magnética quais as partes do cérebro envolvidas na tarefa. Os
objetos da pesquisa passaram então a praticar o exercício dos dedos todos os
dias ao longo de quatro semanas, tornando-se pouco a pouco mais eficientes e
rápidos. Ao final do período de quatro semanas, foi repetido o exame do
cérebro, e ele revelou que a área do cérebro envolvida na tarefa havia
expandido. Isso indicou que a prática regular e a repetição da tarefa haviam
recrutado novas células nervosas e haviam mudado as conexões neurais que
originalmente estavam envolvidas na tarefa.
Essa notável característica do cérebro parece ser o
embasamento fisiológico para a possibilidade de transformação da nossa mente.
Com a mobilização dos nossos pensamentos e a prática de novos modos de pensar,
podemos remodelar nossas células cerebrais e alterar o modo de funcionar do
nosso cérebro. Ela é também a base para a idéia de que a transformação interior
começa com o aprendizado (novos estímulos) e envolve a disciplina de substituir
gradativamente nosso “condicionamento negativo” (correspondente aos nossos
padrões atuais característicos de ativação de células nervosas) por um
“condicionamento positivo” (com a formação de novos circuitos neurais). Assim,
a ideia de treinar a mente para a felicidade passa a ser uma possibilidade
real.
Texto do Blog Buda Virtual. Leia o texto original clicando aqui.