segunda-feira, 8 de junho de 2015

O Tratamento dos Pensamentos



    Os principiantes, sem saber com exatidão o que é meditação, criam uma expectativa de uma calma perfeita, totalmente livres de pensamentos. Temem sua vinda, e quando estes surgem desolam-se por sua incapacidade de meditar.

    Temer os pensamentos, irritar-se ou inquietar-se com seu aparecimento, crer que a falta de pensamentos é uma boa coisa em si, são erros que conduzem a um estado de frustração e culpa inúteis.

    A mente de um não-meditador, de um principiante e de um meditador confirmado é atravessada por pensamentos. Mas, a maneira de abordá-los varia de modo considerável de um para outro.

   Alguém que não pratica meditação é, em sua relação com os pensamentos, semelhante a um cego,  o rosto voltado para uma estrada longínqua. O cego é incapaz de ver se automóveis passam ou não na estrada. Da mesma forma, a pessoa comum, embora experimentando um sentimento de desconforto e mal-estar interiores, não está, em absoluto, consciente da torrente de pensamentos que, no entanto, ecoa sem interrupção.

   Ao começarmos a meditar, descobrimos os olhos para ver, mas gostaríamos que não passasse nenhum automóvel na estrada. Em um primeiro automóvel, nossa atenção decepciona-se. Um segundo, nova decepção. Um terceiro, irritamo-nos, etc.

  A esperança ingênua de uma estrada vazia é incessantemente enganada. Estamos ao mesmo tempo conscientes e infelizes com a sucessão de veículos. Cada automóvel que passa é uma nova dificuldade. Revoltamo-nos contra um estado de coisas inevitável.

  Quando encaramos a meditação como um espaço desprovido de pensamentos, cada pensamento que se apresenta contradiz com evidencia esse esquema preconcebido; estamos em situação de fracasso quase permanente.

  Quando, ao contrario, compreendemos bem em que consiste a meditação, vemos desfilar os automóveis, mas sem revolta nem recusa, sem ter decidido que a estrada deveria estar vazia.  Não esperamos a ausência de veículos, assim como não apavoramos com sua presença.

  Os automóveis passam e os deixamos passar; eles não são nem nocivos, nem benéficos. Se os pensamentos se elevam, deixamos que passem naturalmente, sem nos ligarmos a eles, nem os condenarmos; se eles não se elevam, não encontramos aí objeto de satisfação particular. Uma abordagem sã dos pensamentos condiciona uma boa meditação.

  As pessoas que compreendem mal a meditação creem que todos os pensamentos devem cessar. Não podemos, de fato, estabelecer-nos num estado sem pensamentos. O fruto da meditação não é a ausência de pensamentos, mas o fato de que os pensamentos cessam de ser nocivos para nós.

  De inimigos, os pensamentos tornam-se amigos. Uma meditação ruim vem em geral da negligencia das práticas preparatórias, mas também, estas tendo sido realizadas, da má compreensão da maneira de colocar a mente.

   As pessoas ordinárias tem a mente perpetuamente distraída, dispersa. Quando meditamos, por outro lado, o maior impedimento vem das produções mentais sobrecrescidas, dos comentários sobre si mesmo e das preconcepções. A meditação autentica evita tanto a distração como os acréscimos mentais.

Bokar Rimpoche.

-Do livro "Meditação, concelhos aos Principiantes", pag. 90, 91 e 92. Editora Shisil



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